Quando eu tinha oito anos, minha mãe se casou novamente e fomos morar em Phoenix, Arizona. Todo verão eu e meu irmão Kevin nos revezávamos e viajávamos para ficar por duas semanas com meu pai biológico em Houston, Texas. Eu passava todo o período escolar ansiando por este momento e, chegando a hora, a excitação era tão grande que eu nem podia suportar.
Eu me lembro de quando Kevin chegou do Texas, o que significava que só faltava um mês para eu visitar meu pai. Notei algo diferente em sua personalidade. Eu me senti insignificante. Ele mostrava as roupas que papai havia comprado e tinha uma voz convencida, um novo corte de cabelos, mascava chicletes. Tudo cheirava a convencimento. Nos próximos dias, ele se gabou acerca de tudo o que ele e papai fizeram juntos. Mencionou pessoas e lugares que eu não conhecia, falou de experiências completamente estranhas para mim. Havia algo nele que queria deixar claro para mim que eu jamais teria um relacionamento tão próximo, íntimo e divertido com nosso pai. E naqueles dias, minha percepção sobre como seria com meu pai foi de glorioso e excitante para sem esperança e terrível. Ao entrar no avião no mês seguinte, senti-me vazio e sem valor. O que eu sonhara por muito tempo agora parecia sem graça, e eu estava sem motivação alguma por causa da vanglória de meu irmão.
Quando me dediquei a amar as pessoas, desprezei todo tipo de vanglória e ostentação, pois eu sabia por experiência própria as consequências disso em nossa caminhada. Certa vez fui convidado a um bom restaurante por um grupo de pastores que tinha grande admiração por mim. Assim que a comida chegou e me pediram para orar, inclinei minha cabeça e fiz uma oração infantil: “Deus é grande e Deus é bom, e Lhe agradecemos por este alimento. Amém”. Ao abrir os olhos, o que vi me fez rir por vários anos, e não tinha preço. Era uma combinação de confusão e decepção totais. Alguns riam de nervoso e outros expressavam um julgamento desanimador. O sentimento de que minha espiritualidade era superior à deles foi destruído.
Não fiz aquilo em desrespeito a eles. Eu simplesmente quis “furar o balão”. Não queria ser colocado num pedestal nem que eles se sentissem como eu naquele dia com meu irmão. Não queria que pensassem que não poderiam contribuir com nada, por acharem que não seriam capazes de ter uma relação tão próxima do Pai quanto a que acreditavam que eu tinha. E não fiz a ultraespiritual oração pelo alimento para que não se sentissem inferiores na espiritualidade.
Só existe uma forma de encorajar e levantar as pessoas feridas, e sempre funciona: é se colocar abaixo delas. As pessoas me agradecem por “eu ser real”. Elas se identificam comigo por eu não transmitir um sentimento de que cheguei a uma perfeição espiritual que jamais alcançarão. Eu faço isso porque amo as pessoas, e o amor jamais se vangloria. O orgulho se vangloria de suas virtudes, mas se realmente amamos, vamos valorizar as nossas fraquezas com o propósito de elevar aqueles que amamos. O problema da vanglória é que ela puxa as pessoas que estão ao nosso redor para baixo. As pessoas sentem que falharam ou, ao menos, são inadequadas. Quando nos vangloriamos, deixamos claro que os outros não acrescentarão nada; e se não acrescentam nada, o relacionamento é impossível. O amor não se vangloria, pois é todo voltado para relacionamentos.
Uma pessoa inacessível é alguém com quem não podemos nos relacionar. As pessoas que dizem ter um nível espiritual muito elevado, acima da média, geralmente são muito solitárias. E este é um grande obstáculo que tenho que vencer quando vou a uma igreja pregar. As pessoas pensam que um pregador convidado tem poderes especiais que elas não têm. E o povo não vai abrir o coração até entender que sou igual a eles.
A vanglória no meio do povo de Deus
Nos últimos vinte anos, percebi que a vanglória se tornou um meio de vida para os cristãos modernos. Uma das maneiras que este orgulho se manifesta é através do exagero em falar que Deus disse isso ou aquilo para eles. O problema é que têm revelação divina para cada til ou jota de suas vidas, e Deus lhes fala sobre que roupa vestir de manhã, que estrada vão pegar, o que vão comer no almoço etc. A razão por que eles informam aos outros mortais que eles estão ouvindo Deus falar não é porque eles estão de fato, mas para nos fazer acreditar que realmente estão. Este grupo do “Deus me falou” causa mais estragos que benefícios, pois pisa nas pessoas e deixa nelas um sentimento de que algo está errado, fazendo-as acreditar que não ouvem a Deus de forma tão clara como eles.
Este espírito de vanglória também é visto nos testemunhos. Estes, algumas vezes, tornam-se uma maneira de excitar a multidão, mas se formos investigá-los a fundo, perceberemos que nada do que está sendo dito aconteceu tal como anunciado. As histórias são exageradas e, como resultado disso, criamos um Deus que não existe. As pessoas ficam maravilhadas porque Deus não move em suas vidas da mesma forma que fez com aqueles que estão falando. Alguns destes acreditam que estão ajudando a Deus. Penso que muitos cristãos têm medo de que as pessoas saibam como as coisas realmente acontecem em suas vidas, pois os ouvintes podem não ser atraídos para Deus. O gabar-se e o embelezar as histórias são para fazer de Deus um super-herói e vender esta imagem ao mundo perdido. Quem assim procede supõe que Deus gosta disso.
Existem também os experientes guerreiros de oração. É maravilhoso ouvi-los confrontando o inimigo, abençoando as pessoas e liberando a unção. Eles dão ordens no reino espiritual em uma linguagem que só as pessoas mais entendidas podem compreender. O maior problema com isto é o sentimento de insegurança que causam na pessoa que está recebendo a oração. Quando tudo termina, esta se sente pior do que quando pediu a oração. Esta maneira prepotente de orar deixa a pessoa numa escravidão espiritual. Tal ostentação enfraquece e diminui a autoestima das pessoas, forçando-as a uma reclusão emocional e espiritual.
Mas por que fazemos isto, já que o amor não se vangloria? Penso que seria impossível ao cristianismo de hoje não pensar que Deus se vangloria, pois a maioria acha que ele é Deus, e tem o direito de se vangloriar! Ele se gaba por seus feitos e por quão grande ele é. Por este motivo, nós exageramos em nossos cultos.
Repetimos muitas vezes os ensinamentos sobre a dor e sofrimento que Jesus passou em nosso favor. Na Páscoa, a igreja faz apresentações e convidamos pessoas pra ver como Jesus sofreu pelos seus pecados. Acreditamos que se as pessoas assistirem a isso, vão obedecer a Deus e dar-lhe o seu melhor a fim de recompensá-lo pelo tanto que Jesus fez por elas. Com 16 anos, eu já tinha assistido a mais de mil encenações da crucificação e centenas de pregações lembrando que Jesus foi crucificado em meu lugar. Esse Deus a que me apresentavam é como a mãe que vive lembrando constantemente aos filhos o quanto ela sofreu no parto, para fazer com que eles se sintam culpados e façam o que ela quer. A mensagem do evangelho “Deus ama você; venha a ele” foi mudada para “Jesus recebeu, em seu lugar, o maior sofrimento que alguém poderia suportar; então, venha a ele”.
Deus não se vangloria
No Velho Testamento, temos vários relatos de manifestações poderosas de Deus: com Moisés, o monte foi rodeado por trovões e grande nuvem de fumaça, a terra tremeu, e o povo não podia se aproximar; Elias invocou a Deus, e o fogo desceu do céu, consumindo seu sacrifício e a água que estava em volta; Ezequiel viu a glória de Deus encher o templo e criaturas que adoravam continuamente, de forma que ele não pôde suportar. O mar se abriu, as montanhas tremeram, os montes se derreteram como cera em sua presença, ele posicionou cada planeta como quis e moveu as estrelas de seu lugar. Nos céus todos clamam “Santo, Santo, Santo!”, e seus inimigos de dissolvem diante de sua presença.
Então como Deus quer que nos relacionemos com ele? Você pode se relacionar com uma nuvem ou ter intimidade com um fogo celestial? Poderia ficar perto de um Deus que pode derreter você? E como Deus quer que você se relacione com ele? Da mesma forma que com um carpinteiro sujo e sem lugar para morar. Os cristãos competem entre si num esforço para descrever a glória e majestade de Deus. Eles usam a linguagem da Bíblia King James para se aproximar de Deus, pois se sentem mais reverentes e santos dessa forma. Eles pensam que é assim que Deus quer e se sentem mais perto da verdade sobre Deus quando lembram uns aos outros a grandeza e majestade do Senhor. Isso me faz pensar nas estrelas de rock – os fãs gritam que os amam, mas, na realidade, o que amam é a sua aparência, suas palavras, seu poder. Eles não querem chegar ao coração, ficando apenas deslumbrados com tudo que cerca o pop star.
Foi exatamente por isso que Deus se fez homem. Ele queria ser conhecido pelo seu ser e não pelo seu esplendor e majestade. Isto seria como fazer parte de um fã clube. Ainda existe uma parte mais profunda de Deus escondida e velada que só alcançaremos quando ultrapassarmos o ofuscante brilho de sua glória. Em Cristo, Deus se fez nada e deixou todo seu esplendor para que pudéssemos ter uma verdadeira intimidade com ele. Ele deseja tanto criar vínculos genuínos com você que se despiu de todo o seu esplendor para deixá-lo à vontade para escolher se quer ou não relacionar-se com ele. Esta é a única maneira que Deus pode ter certeza de que você o ama. Ele ficou menor que você para que pudesse elevá-lo. Não se tornou apenas um homem, mas um servo dos homens e morreu como criminoso na cruz. Uma das últimas coisas que fez foi se ajoelhar e lavar pés sujos. Jesus é Deus que não se vangloria. Pedro, percebendo isto, não quis aceitar Deus dessa forma. A resposta de Jesus foi a mesma que daria a muitos cristãos de hoje: “Você deve ser lavado pelo carpinteiro!” Se não recebermos a Deus em seu lado mais simples, fica impossível ter intimidade com ele.
Imagine se um bandido entrasse em minha casa planejando matar minha esposa e filha, e eu convencesse a ele a tomar minha vida no lugar da delas. Então ele me leva para um local onde me filma sendo torturado por horas até finalmente me matar. Você acha que eu gostaria que minha família ficasse assistindo a este vídeo, para ser convencida de como eu me sacrifiquei por amor a ela? Claro que não. Eu ia querer que se lembrassem da minha vida e do meu amor por eles, e não do sofrimento que suportei para salvar a vida deles. É assim que Deus se sente quando encenamos várias vezes as cenas da paixão de Cristo na tentativa de encher as pessoas de culpa e condenação.
Jamais pense em dar algo a Deus pelo sofrimento que Jesus passou por nós. Foi um presente, e tentar dar algo em troca quando ganhamos um presente é o mesmo que rejeitar o presente. Você jamais saberá quanto foi pago na cruz porque Deus removeu a etiqueta com o preço. Simplesmente receba e siga em frente. Quem gosta de ostentação deixa claro o quanto pagou por um presente, mas Deus não é assim.
Ele também não compara o seu relacionamento com ele com o de nenhuma outra pessoa. O que ele quer com você é totalmente único e nenhuma pessoa do mundo vai ter o que vocês têm juntos. Jamais deseje se relacionar com ele da forma com que ele se relaciona com outra pessoa. Ele não quer isso. À medida que fui entrando na essência do amor, fui compreendendo a verdade acerca do coração de Deus. Descobri que tudo o que eu tinha falado na igreja não era verdadeiro. Continuando minha caminhada, fui descobrindo que Deus se parecia muito mais comigo do que eu poderia imaginar. E nosso próximo passo nesta jornada pode ser o mais assustador de todos.
[Continua na próxima edição]
Traduzido e adaptado por Ezequiel Netto