Como é prazeroso quando somos surpreendidos pela Palavra de Deus, seja da maneira mais convencional – por meio da leitura bíblica – ou quando ela nos é revelada através dos irmãos em uma conversa, um gesto de amor, uma poesia, uma música, um filme, uma manifestação singela da natureza… Enfim, das mais diversas maneiras, inclusive as mais inesperadas, afinal de contas o Deus a quem pertencemos tem uma criatividade ilimitada e uma imensa capacidade de nos surpreender a cada instante. A nós cabe apenas estarmos atentos e abrirmos o coração para percebê-lo em nosso “caminho”.
Gostaria de compartilhar com os leitores um episódio em que fui surpreendido, confrontado, motivado e agraciado com a Palavra de Deus. Certa vez, eu e alguns irmãos da minha cidade estávamos estudando sobre os profetas menores. Combinamos de ler o livro que seria estudado durante a semana e compartilhado em nosso encontro habitual do final de semana.
Para mim, particularmente, foi um estudo bastante proveitoso, principalmente porque ajudou a clarear algumas coisas que antes não compreendia muito bem e me serviu de incentivo para fazer uma leitura mais atenta e debruçada sobre esses livros, antes lidos com preconceito, ou seja, ligeiramente, sem prestar muita atenção nas linhas e entrelinhas, como se o contexto escrito já fosse matéria aprendida.
O livro de Ageu, em especial, falou muito comigo. Para ser sincero, jamais pensei que esse livro me proporcionaria um momento de tanto prazer na leitura da Bíblia. Nesse dia em que li o livro de Ageu, eu estava bem desanimado, preocupado e inseguro com algumas coisas, principalmente com aquelas que dizem respeito ao meu futuro. Deus, com sua natureza amorosa e pessoal, deu-me um “se liga”, que foi certeiro. Bem, vamos às reflexões que brotaram dessa leitura gostosa.
1. “Assim fala o Senhor dos Exércitos: Este povo diz: Não veio ainda o tempo, o tempo em que a Casa do Senhor deve ser edificada.” (Ag 1.2)
Somos imediatistas em muitas coisas quando se trata da nossa vontade e dos nossos interesses pessoais, porém, infelizmente, muitos de nós não cultivamos esse mesmo senso de urgência quando se trata de interesses do reino de Deus. Deus tem nos chamado para edificar a sua CASA, ou seja, a Igreja Corpo de Cristo, e nós, em resposta a esse chamamento, à semelhança do povo de Israel no contexto histórico do livro de Ageu, expressamos com palavras ou atitudes que ainda não é o tempo de edificar a Casa do Senhor. Estamos tão atarefados e preocupados com as nossas coisas que temos nos esquecido do que está no coração de Deus.
2. “Veio, pois, a palavra do Senhor, por intermédio do profeta Ageu, dizendo: Acaso, é tempo de habitardes vós em casas apaineladas, enquanto esta casa permanece em ruínas?”(Ag 1.3-4)
Deus chama a atenção do povo com uma pergunta. É como se Ele falasse: “Vocês vão continuar aí parados, estagnados dentro de suas casas, no lugar de conforto, enquanto a minha Casa permanece em ruínas? Insistirão em ficar dentro dessa estrutura que vocês produziram, ficarão parados, aprisionados na religiosidade, na institucionalização, na formalização e na tradição, enquanto a minha Casa, a minha Igreja permanece em ruínas? É nessa casa (igreja-instituição, igreja-evento) que querem habitar? É nessa igreja que querem viver? É nisso que querem gastar a vida? Venham habitar na minha Casa, venham receber a vida do Corpo de meu Filho… É nesta Casa que eu quero morar com vocês. Escolham defender o Corpo de Jesus e não mais seus segmentos religiosos. Ah, o Corpo de meu Filho está quebrado!”
3. “Tendes semeado muito e recolhido pouco; comeis, mas não chega para fartar-vos; bebeis, mas não dá para saciar-vos; vestis-vos, mas ninguém se aquece; e o que recebe salário, recebe-o para pô-lo num saquitel furado.” (Ag 1.6)
Sem Deus, nada nos satisfaz, tudo é em vão, à toa, vaidade, sem valor. Consumimos e nos envolvemos com as coisas que nos são oferecidas e, às vezes, impostas por este sistema em que vivemos, e achamos que está tudo bem, que é assim mesmo. Acabamos nos conformando com a forma como as coisas nos são apresentadas. Alimentamo-nos, mas não estamos fartos. Bebemos, porém, ainda permanecemos com sede. Estamos vestidos, entretanto continuamos com frio. Não adianta insistirmos, pois é um ciclo vicioso que jamais poderá nos satisfazer. Para saciarmo-nos, precisamos ter a experiência do encontro da mulher samaritana com Jesus: beber da água que ele oferece e saciar definitivamente a nossa sede (Jo 4.14). Só o Cristo pode nos satisfazer eternamente.
4. “Subi ao monte, trazei madeira e edificai a casa; dela me agradarei e serei glorificado, diz o Senhor.” (Ag 1.8)
Esta ordenança do Senhor envolve ação, colocar a “mão na massa”, sair da posição de conforto, do nosso comodismo e apatia. Entretanto uma coisa importante a observar é que a motivação da ação está na edificação da Casa do Senhor, não da nossa. Isso vai agradar-lhe e glorificar-lhe. Fazer só por fazer não adianta, será apenas esforço humano que jamais agradará e glorificará a Deus. No máximo, vai agradar e glorificar ao homem e seu humanismo, mas não a vontade de Deus. Nossa ação deve ter como grande fim a edificação da Casa do Senhor – o Corpo de Cristo.
5. “Esperastes o muito, e eis que veio a ser pouco, e esse pouco, quando o trouxestes para casa, eu com um assopro o dissipei. Por quê? – diz o Senhor dos Exércitos; por causa da minha casa, que permanece em ruínas, ao passo que cada um de vós corre por causa de sua própria casa.” (Ag 1.9)
Este modelo de igreja que nós vivemos hoje, que alguns consideram como algo que se desenvolveu desde a época da igreja primitiva, será dissipado quando a verdadeira Igreja orgânica surgir. A Igreja cresce e se desenvolve à medida que cresce o testemunho de Cristo que ela dá, e não quando aumenta seu número de membros e templos. No organismo da Igreja não há lugar para a organização das instituições. Um processo de desconstrução deverá sobrevir ao modelo atual.
Precisamos rever nossas prioridades a cada dia, em cada decisão, examinar o que é mais valioso para nós e em que estamos consumindo nossa vida. Precisamos parar de correr atrás das nossas coisas e entrar nas coisas do alto, desistir de nós mesmos e reconhecer nossa falência. Necessitamos viver o versículo “buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas” (Mt 6.33). O reino e a vontade de Deus nos bastam!
Isso precisa descer ao nosso coração, é uma bênção grandiosa e também um desafio constante. Pode ser que demore, ou não. Nós não conseguimos isto; é obra do Espírito Santo em nós. Mas precisamos desejar buscar o reino em primeiro lugar, o resto é obra do Pai, problema de Deus.
Então, qual é a Casa que Deus nos chama a construir? Hebreus 3.6 nos dá a resposta: “Cristo, porém, como Filho, em sua casa; a qual casa somos nós, se guardarmos firme, até ao fim, a ousadia e a exultação da esperança”. Um dos principais aspectos práticos da edificação da Casa do Senhor encontramos em 1 Ts 5.11: “Consolai-vos, pois, uns aos outros e edificai-vos reciprocamente…” (ver também Gl 6.1-2; Ef 2:20-22, 2 Co 1.4-5). Os cristãos jamais devem ficar sozinhos; é preciso virar nossas cadeiras, sair do lugar de conforto e nos mover em direção ao outro, pois é no próximo que a edificação da Casa acontece.
6. “Por isso, os céus sobre vós retêm o seu orvalho, e a terra, os seus frutos.” (Ag 1.10)
Portanto, edificando a Casa do Senhor, receberemos a manifestação, o agir, a revelação do alto (orvalho que vem do céu), e isso produzirá a prática do evangelho, do reino de Deus, da comunhão em nosso meio (e a terra, os seus frutos).