Este artigo é o décimo primeiro de uma sequência sobre dons proféticos, assunto que o autor vem pesquisando desde 2002 e compartilhando em muitos lugares.
“É perigoso ter o ministério profético na igreja!” Este sentimento está bastante disseminado no meio cristão e atinge também todo aquele que anda pela trilha do milagre, das curas, do sobrenatural em geral. É motivado por preocupações e frustrações relacionadas com a ideia de que este ministério é exercido por pessoas iradas, severas, que vivem gritando ameaças à igreja com os juízos de Deus.
Será que ira, atitudes críticas e falta de compaixão são requisitos para o ministério profético? E uma pessoa amável e atenciosa seria menos qualificada? Somos cativados de tal forma pelos profetas do Antigo Testamento e suas proezas que chegamos a considerar que seus defeitos de caráter são traços característicos do ministério profético. Isto se dá por dois problemas principais:
- Muitos não têm um entendimento claro do coração de Deus, acreditando que Ele está sempre irado, impaciente e que se ofende com facilidade, impressão distorcida que tenderão a representar em seu ministério.
- Temos dificuldades em aceitar que os profetas bíblicos, mesmo atuando com poder e revelação, eram pessoas normais, que tinham atitudes pecaminosas e falhas de caráter (Tg 5.17-18). Não aceitamos que Deus pode operar em vasos imperfeitos e fracos. Os profetas da Bíblia que trouxeram uma imagem do Senhor como severo e não misericordioso erraram, e Deus os fez responsáveis pelos seus pecados.
Ampliando a nossa visão
Paulo escreve em 1 Coríntios 14.3 que a profecia é para edificar, encorajar e consolar. Entretanto, a maior parte dos modelos de profeta do Antigo Testamento, e também muitos modelos atuais, não atendem a este critério. Como conciliamos isto, então? Existe um problema na igreja que é julgar um grupo a partir de seus indivíduos mais extremados, e isto também ocorre com o ministério profético. Quando pensamos em um profeta, Elias vem logo à nossa mente. Lembramos da sua batalha no Monte Carmelo, convocando o povo a se arrepender da apostasia; de como matou os falsos profetas como expressão do juízo de Deus; de como Deus respondeu com fogo a uma calma oração; da
matança dos enviados do rei. Seu ministério foi bastante expressivo e se tornou um padrão para nós. Isto se torna um sério perigo, se olharmos para o homem e não compreendermos que Deus pode usá-lo com Seu poder e, ao mesmo tempo, não endossar muitas atitudes erradas que ele tome. Temos que separar o que é de Deus daquilo que é do homem, para que possamos obter o padrão correto para um ministério.
“Elias era homem sujeito às mesmas paixões que nós e, orando, pediu que não chovesse e, por três anos e seis meses, não choveu sobre a terra. E orou outra vez, e o céu deu chuva, e a terra produziu o seu fruto.” (Tg 5.17-18).
Nem todos os profetas do Antigo Testamento trataram com severidade as pessoas ao seu redor. Muitos foram conselheiros dos reis de Israel e até de reis pagãos. Trazer um ultimato espiritual não era a única função do profeta. Se examinarmos este ministério com visão aberta, a nossa compreensão do que Deus espera de um profeta e do espírito que está por trás dele aumentará bastante.
O modelo de Elias
Elias representa o modelo mais elevado de ministério profético para a maioria das pessoas. Não tolerava a idolatria em Israel, enfrentou com ousadia um dos piores reis da história daquela nação, declarou sem medo a palavra de Deus, eliminou sozinho 850 falsos profetas, disse que não choveria durante 3 anos, e assim se cumpriu. Ele é um bom exemplo de fé e coragem. Contudo, ele tinha fraquezas humanas como qualquer um de nós. Faltava-lhe, em alguns
momentos, compaixão, paciência e um coração misericordioso. O apóstolo Paulo cita que Elias, em seu desespero e ira, intercedeu contra Israel (Rm 11.2-3) para que Deus julgasse com severidade esta nação. Apesar de admirarmos sua atuação, em algumas situações seu caráter o atrapalhou e impediu que fosse usado por Deus.
Aparentemente, não considerou a Obadias nem aos 100 profetas que estavam escondidos (1 Rs 18.1-4) quando disse ao anjo do Senhor que só restara ele como profeta em Israel (1 Rs 19.10,14). Foi retirado
de cena antes de completar seu ministério (1 Rs 19.15-17 e 2 Rs 8.11-15/9.1-3). Quando Deus quis ajudar a Acabe, não usou Elias (1 Rs 20.13-28) e, em outras situações, enviou outros profetas ao rei (1 Rs 20.41-43; 22.17-23). Será que Elias não entendia que Deus poderia encorajar e fortalecer a Acabe (que levou Israel a idolatria) para destruir os inimigos de Israel?
Posteriormente, Deus mostra a Elias o arrependimento e humilhação de Acabe (1 Rs 21.29). Deus queria ensinar a Elias que ele, o Senhor, tem um coração disposto a salvar, a redimir, a perdoar, e que o profeta deveria refletir a natureza divina, que se alegra com a misericórdia, e não com o juízo. Muitos profetas de hoje também precisam aprender este ensinamento, de que o Senhor é longânimo e responde com misericórdia a quem dá um passo de arrependimento (Lc 15.17-23). Em 2 Reis 1.9-12, vemos Elias invocar fogo do céu, matando 102 soldados enviados por Acazias. Com que finalidade ele fez isto? Observando esta história e ignorando o mandamento do Senhor de amarmos os nossos inimigos, muitas pessoas acreditam que os profetas estão dispensados de ter o fruto do Espírito e andar na prática do amor. Estas, com muita rapidez, invocam o juízo de Deus ao se sentirem ameaçadas, rejeitadas, ou quando alguém questiona suas profecias.
Se nossa motivação for ira e orgulho, não expressaremos o verdadeiro espírito da profecia e o caráter de Deus (1 Jo 4.8,16). O amor é expressão de maturidade cristã (Ef 4.15). É mais fácil expressar juízo e ira, pois isto tem origem na nossa carnalidade. Para profetizarmos esperança e vida necessárias para mudar uma situação, precisamos do Consolador (Jo 14.16,26).
“Aqueles que têm pouca ou nenhuma compaixão têm prazer no juízo. Os que são maduros têm prazer em ver as pessoas voltando-se para Deus, e recebendo dele misericórdia. A avidez pelo juízo não é característica do ministério profético, e sim uma falha de caráter”. (Steve Thompson)
O modelo de Jonas
Deus queria que Jonas fosse profetizar em Nínive, nação inimiga de Israel, mas ele não aceitou, pois já sabia que Deus voltaria atrás em seu juízo caso houvesse arrependimento entre os ninivitas. No navio, quando fugia e uma tempestade sobreveio à embarcação, mesmo após identificarem Jonas como culpado de toda tragédia, os marinheiros resistiram a lançá-lo ao mar, e tentaram remar com toda força para salvar a vida de Jonas, demonstrando, com isto, compaixão e sensibilidade espiritual não encontradas no profeta de Deus. Apesar de ser o profeta cujo ministério foi o mais eficaz, pois só após 100 anos Deus precisou enviar um outro a Nínive, Jonas foi, entre todos os representantes divinos, o mais inflexível e teimoso de que temos notícia. Os três dias no ventre do peixe mudaram, porém parcialmente, seu duro coração. Em nenhum momento de sua história pareceu demonstrar compaixão pela vida humana. O único sentimento observado foi por uma planta que lhe trazia sombra. De modo bem diverso, o amor de Deus foi tão profundo, que estava sensibilizado não somente pelas pessoas de Nínive, mas também pelos seus muitos animais (Jn 4.11).
Até quando vamos continuar não conhecendo o coração de Deus?
Dar a entender que Deus está irado quando não está é provavelmente um dos pecados mais sérios que podemos cometer. Este foi o pecado que impediu Moisés de entrar na Terra Prometida (Nm 20.2-11; Êx 34.6-7). Deus não estava irado com o povo, mas Moisés estava. Então, ele deu a entender que sua ira era a ira de Deus. As consequências disto não foram apenas um juízo sobre Moisés, mas uma mensagem deixada para todos nós.
O jovem profeta
“E eis que, por ordem do SENHOR, um homem de Deus veio de Judá a Betel; e Jeroboão estava junto ao altar, para queimar incenso. E clamou contra o altar com a palavra do SENHOR e disse: Altar, altar! Assim diz o SENHOR: Eis que um filho nascerá à casa de Davi, cujo nome será Josias, o qual sacrificará sobre ti os sacerdotes dos altos que queimam sobre ti incenso, e ossos de homens se queimarão sobre ti. E deu, naquele mesmo dia, um sinal, dizendo: Este é o sinal de que o SENHOR falou: Eis que o altar se fenderá, e a cinza que nele está se derramará. Sucedeu, pois, que, ouvindo o rei a palavra do homem de Deus que clamara contra o altar de Betel, Jeroboão estendeu a mão de sobre o altar, dizendo: Pegai nele. Mas a mão que estendera contra ele se secou, e não a podia tornar a trazer a si. E o altar se fendeu, e a cinza se derramou do altar, segundo o sinal que o homem de Deus apontara pela palavra do SENHOR. Então, respondeu o rei e disse ao homem de Deus: Ora à face do SENHOR, teu Deus, e roga por mim, para que a minha mão se me restitua. Então, o homem de Deus orou à face do SENHOR, e a mão do rei se restituiu e ficou como dantes.” (1 Rs 13.1-6). Este é o relato de um profeta totalmente livre de sentimentos de ira e vingança próprios. Mesmo recebendo ameaça de morte, ainda orou pedindo misericórdia por Jeroboão. Se fosse algum de nós, Jeroboão não teria a mesma sorte… Em vez de apenas à mão, talvez ordenássemos ao corpo inteiro que secasse.
Que modelo de profeta vamos seguir?
Alguns discípulos de Jesus também tinham este sentimento negativo, querendo seguir o modelo de Elias (Lc 9.51-56). Tinham fé suficiente para mandar descer fogo do céu, mas não para expulsar um demônio de uma criança (Lc 9.37-40). Às
vezes é mais fácil motivar a fé pelo ódio que pelo amor. A Bíblia apresenta muitos erros e pecados de algumas pessoas, não para serem copiados, mas para que possamos evitá-los. Devido aos inúmeros erros cometidos por imaturidade, muitas pessoas tendem a rejeitar este ministério na igreja. O ministério profético não é para destruir nada; por sua natureza, é um ministério para aperfeiçoar as pessoas e trazê-las para mais perto de Deus. Ao descobrirmos como é o coração de Deus, como são os seus padrões, e se os proclamarmos, começaremos a ver o verdadeiro espírito de profecia surgir naqueles que estão despontando neste ministério. Eles serão uma bênção que não podemos imaginar!
*** Baseado no livro “Vocês todos podem profetizar”, de Steve Thompson, Editora Shemá
Artigo muito bom , abriu os meus olhos para o verdadeiro Deus , Amem